Eu devia ter oito anos quando ela morreu. Lembro do cheiro do cabelo, do corpo sofrido dos maus tratos. Os olhos eram iguais aos meus. Azuis.Mas de uma dignidade imensa. Lembro também como me acordava com beijos e fazia meu café da manhã pra poder ir a escola. Aquele sanduiche maravilhoso que fazia. Disseram que foi um acidente. Acordei com seus gritos e meu pai fingindo socorrê-la. Um tiro na cabeça. Tinha os braços arranhados e os olhos inchados de socos. Acho que fizeram parecer um assalto, sei lá. Virei pro lado e adormecí novamente. Me calei durante anos. Não me vinham palavras, gestos , nem ao menos vontade de gritar pro mundo quem era o monstro que me deu vida. O monstro que me fez sentir ódio pela primeira vez. Que me fez sentir vontade de comer sua carne aos poucos, como uma criança saboreia o sorvete preferido. Sentimentos sufocados nos anos que se seguiram como se nada que eu fizesse fosse adiantar. Uma sede de sangue me invadia a alma quando chegava o verão. O ar quente que...
" ce ne sont pas mes gestes que j escrís;c'est moi, c'est mon essence."